O cinema não tem fronteiras nem limites. É um fluxo constante de sonho.
(Orson Welles)
Está entre os filmes mais apreciados dos anos 1990 e, sem dúvida, um dos melhores já produzidos por Hollywood em todos os tempos. Infelizmente, o público não o acolheu na época do lançamento e sua audiência de massa foi conquistada anos depois por meio do vídeo. Não é um trabalho comum sobre a vida de presidiários e tampouco fica no plano superficial das emoções. Ele é, sobretudo, o prolongamento de uma existência, alimentada pela esperança e solidificada pela amizade, o que é raro dentro de um presídio.
Atrás das grades, o ex-banqueiro Andy Dufresne (Tim Robbins) passa a viver num mundo totalmente avesso à sua realidade e lá edifica uma fortaleza interior capaz de sobreviver ao martírio que lhe é impiedosamente imposto, além de manter vivo dentro de si o projeto de fuga, que é espetacular.
O diferente neste drama é que ele não retrata o personagem principal como o herói, o destemido ou o rebelde que grita contra o sistema corrupto que lá impera. O que temos é a redenção de um homem, que, mesmo condenado à prisão perpétua – ele foi acusado de matar a sua mulher e o amante – não deixa de acreditar que é possível conseguir a tão sonhada liberdade. Ele conquista a amizade e a admiração do preso Ellis “Red” (Morgam Freeman – Os Imperdoáveis, de 1992) e juntos protagonizam uma história comovente de solidariedade. Suas excelentes atuações dos mesmos foram rejeitadas pela academia, o que é lamentável.
“Red” está na prisão há muito tempo, é um veterano. Sua experiência, aliada a serenidade de Andy são decisivas para a superação de todos os transtornos. Sucede que ele não que deixar o presídio, pois argumenta que não saberia viver fora dos muros – na prisão ele é o rei e nas ruas apenas um ex-condenado. Esta relutância é contornada pelos argumentos sinceros de Andy.
O filme é muito bem dirigido por Frank Darabont e baseado em um livro escrito pelo famoso Stephen King. O diretor tece uma narrativa para observarmos as vidas de todos os envolvidos, em suas angústias e seus sofrimentos e, em momento algum, tenta ludibriar o espectador com cenas prolongadas de violência. O que mais desperta a atenção no trabalho de Darabont é a seqüência dos planos, que nos transporta para o interior da tela e nos envolve ao ponto de esquecermos que aquilo é uma sessão de cinema.
Você só consegue admirar realmente um filme quando a ele assisti vezes, revendo cenas e detalhes que não são percebidos no primeiro olhar, o que é natural. O gosto por grandes filmes é edificado com a familiaridade.
O confinamento não prisão não destruiu a alma de Andy, pois aprisionaram apenas seu corpo físico, que suportou os extremos da dor, a escuridão da solitária, a repugnante violência sexual e a selvageria do sistema interno. A desumanidade sofrida não foi forte o suficiente para transformá-lo em apenas mais um detento – seu sorriso ao sair do enclausuramento sintetiza a grandeza de seu espírito. O fundo musical nos leva a outro mundo.
Um Sonho de Liberdade é o encontro da lealdade, da verdadeira amizade, que um condenado conquista no interior de uma penitenciária. O estranho é que estes impagáveis valores não estão nos chamados homens da lei que guarnecem aquele ambiente – um mundo de injustiças e crueldades – e sim nos proscritos e isolados do sistema legal.