É a Turquia, cara. Ser inocente aqui é mero acidente.
(Jimmy, companheiro de cela para Billy)
O olhar distante é sempre fácil e, muitas vezes, ignora o que está vendo, seja uma cena real ou mesmo uma tomada cinematográfica. Nosso aparente sólido castelo, no entanto, pode ruir a qualquer momento, bastando para isto uma acusação: você está preso! Sim, a indiferença acaba e o chão que pisamos parece sumir. O mais grave é quando isto ocorre em terras estranhas.
No filme, um jovem ianque procura uma saída diante da condenação que sofre em um arremedo de processo na Turquia, pois fora flagrado tentando deixar o País levando haxixe. Para viver o protagonista, o diretor Alan Parker (Mississipi em Chamas, de 1988) apostou no novato Brad Davis – um talentoso ator que morreu aos 41 anos. Sua atuação foi marcante, irretocável e não será esquecida por nós, cinéfilos.
Imaginemos a vida em uma prisão. Pense num final de tarde trancado em uma cela, inclusive, durante o tristonho domingo. Quando chega a noite, ela traz os gritos e os gemidos: é mais uma sessão de atos libidinosos e forçadas carícias – vil noite que me atormenta. É neste mundo que Billy Hayes (Brad) passa a viver em face da sentença imposta: trinta anos de prisão. O Expresso da Meia-Noite é único meio que ele tem para sair daquele inferno.
A fuga é o único caminho e a todo instante ficamos a imaginar como Billy vai pegar o misterioso “expresso” – não sabemos se ele existe – uma vez que pode ser apenas fruto da imaginação de seu companheiro de cela Max (John Hurt), que já não tem apreço por quase nada, vivendo em uma eterna viagem alucinógena. A droga é o motor de suas emoções e uma forma de suavizar o triste viver.
Com o passar do tempo, os amigos de cela começam a perder a sanidade e Billy Hayes – que passa por um momento de delírio – precisa ser forte para não sucumbir diante de tanta crueldade. Ele precisa dizer adeus a um pesadelo perversamente forçado pelas insensíveis autoridades turcas, pois, mesmo sendo um criminoso, não poderia ser tratado de maneira tão desumana.
O drama – baseado em uma história verdadeira – além de desnudar as violências sofridas pelos presidiários, denuncia o corrupto sistema de direção do estabelecimento penal, que empurra os detentos para outra vida criminosa por detrás das grades, deixando-os em permanente tensão. A angústia, a ânsia e o desespero, aos poucos, vão tomando conta de todos e o plano de fuga vai ficando cada vez mais distante. Tudo é contagiante e a trilha sonora é marca registrada nesta inesquecível jornada em busca da liberdade.
É difícil esquecer a cena da visita da namorada Susan (Irene Miracle), quando Billy se masturba diante do vidro e tenta tocar em vão os seios de sua amada. Eles estão separados por uma simples vidraça e tão distantes pelas amarras da lei. Reflita muito, muito mesmo, antes de trilhar os caminhos que levam ao cárcere, você pode não suportar as suas agruras, as marcas serão indeléveis.
Mesmo depois de alguns anos, o que mais me impressiona no filme é sua atualidade, sua contínua forma de expressar um submundo que existe; notadamente, no nosso sistema pátrio, onde temos masmorras medievais que transformam meros delinquentes ocasionais em profissionais do crime.
A liberdade é a vida em sua plenitude e não devemos perdê-la. Mesmo para quem nasce livre, custa caro manter este estado, ainda que trilhando os caminhos da lei. Há sempre uma injustiça na espreita que pode nos atingir; imagine violando o sistema legal de um país estranho. Como disse o preso Jimmy: Ser inocente aqui é mero acidente.
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