No meu próximo filme, eu gostaria de tentar alguma coisa diferente – estou ficando cansado de fazer histórias realistas.
(Do livro Conversas com Woody Allen, antes de rodar este)
Com marcante abertura, visitando os belos e conhecidos locais da cidade; tudo ao som da trilha sonora composta pelo francês Stephane Wrembede, Paris nos é mostrada na atualidade e no passado – os anos 1920, da vida boêmia e dos artistas, dentre os quais Pablo Picasso, Zelda e Scott Fitzgerald, Matisse, Ernest Hemingway, Salvador Dalí, o cineasta Luis Buñuel e outros.
Gil Pender (Owen Wilson) é o principal protagonista, um roteirista angustiado. Está prestes a se casar, e isso não parece muito animador. A sua noiva é insossa, mas muito bonita. A futura mulher é Inez (Rachel McAdams). O relacionamento emite sinais de ruína, sentimos que não existe química entre os dois. Isto é revelado quando entra em cena o intragável crítico de arte Paul (Michael Sheen) – os orgulhos se somam.
Perambulando pelas ruas da cidade, numa noite de desânimo, Gil pega carona em uma estranha carruagem, sendo conduzido a uma viagem de volta no tempo, onde termina por encontrar famosos escritores nas noites parisienses. Inebriado pelo ambiente nostálgico e acolhedor, encontra forças para acabar seu livro e, dessa forma, volta a sentir motivação para trabalhar nos seus projetos.
Nos seus passeios noturnos, iniciados sempre à meia-noite, Gil conhece a bela Adriana (Marion Cotillard – Piaf – Um Hino ao Amor, de 2007), amante de Pablo Picasso, e que já tinha tido um relacionamento com o pintor Modigliani. Eles engatam uma paixão sem sexo. Nesta nova dimensão, acabam sendo levados mais longe ainda, aos anos 1890. Estão agora na Belle Époque, que Adriana considera o melhor período para se viver. Ao se encontrarem com os pintores Lautrec e Paul Gaugin, ambos dizem que melhor seria ter vivido na Renascença…vai entender!
O filme nos mostra a insatisfação do ser humano com seu momento. Houve uma época melhor. Sempre dizemos isso. Tal tempo! Tal era! Por vezes, esquecemos que temos uma realidade que nos cerca. É uma soberba reflexão sobre como as pessoas nunca estão satisfeitas com suas vidas ou que se sentem deslocadas no tempo em que vivem. Ao final, Gil passa a aceitar que o presente é o que importa; onde devemos estar, ser e lidar com nossas limitações e frustrações.
O roteiro é bem enlaçado, uma vez que o diretor Woody Allen sequencia as tomadas entre as noites junto aos seus nostálgicos novos amigos e durante o dia com sua insatisfeita e infeliz realidade – o ponto alto da trama. É o jeito diferente da filmografia do seguidor de Ingmar Bergman, buscando inspirações nos sonhos e na vida real. Seus filmes nunca acabam, ficam sempre remoendo nosso interior.
Allen – O Sonho de Cassandra, de 2007 – nunca é o mais do mesmo, mesmo recolhendo pedaços de histórias já contadas. Inova! Cria situações inusitadas e nos amarra no seu mundo cinematográfico. Reinventa o cinema. Em tempos escassos de produções diferenciadas, ele nos encanta com um filme maravilhoso e um final simples – que adorei!