Estávamos lançando-os ao fogo, aos milhares, para a pior das mortes, não para vencer a guerra, apenas para podermos ficar com o trigo, o arroz e o petróleo da Mesopotâmia.
(T.E Lawrence na vida real)
Filme que lançou e consagrou Peter O`Toole (Calígula, de 1982) que, como Malcolm McDowell em Laranja Mecânica, também nunca mais foi o mesmo depois desta marcante e inesquecível atuação, quando interpretou T. E. Lawrence – lendário oficial inglês que teve decisiva participação na unificação dos árabes no conflito contra os turcos durante a 1ª Guerra Mundial. Os líderes das tribos do deserto são representados pelos atores Omar Sharif (Doutor Jivago, de 1965) no papel de Sherif Ali, Antony Quenn (Zorba, O Grego, de 1964) como Auba abu Tayi e Alec Guiness, interpretando o Príncipe Feisal.
Na sua trajetória, Lawrence se alia aos líderes e convence-os a segui-lo na travessia quase louca pelo tórrido território e, para isto, usa a lógica e o diálogo como arma, passando a ser respeitado pelos rudes comandantes. Seus argumentos estavam corretos e, assim, foi possível alcançarem vitórias memoráveis nas batalhas.
As locações no deserto mostram sua imensidão e sua insolência cruel, onde homens se matam em busca ou para protegerem suas fontes de água. Nesta disputa, uma cena marcante: um ponto pequeno na aridez vai crescendo, crescendo, e, aos poucos, a tela nos mostra a figura de um homem galopando – Omar Sharif está soberbo na cena – que vem em defesa de seu precioso líquido, uma vez que percebe a presença de um estranho, que no caso é Lawrence saciando sua sede.
As paisagens desérticas, sufocantes, de homens caminhando ou a galope em seus animais, deixam-nos à espera para sabermos até onde vão chegar. Há uma atmosfera de extrema secura que só é suavizada com o cair da noite. David Lean teve de enfrentar meses de tempestades de areia para capturar as imagens perfeitas daquela hostil e intrigante terra e, então, projetá-las e eternizá-las na magia do cinema.
Lawrence é um homem magro, meio desajeitado – em algumas cenas parece meio afeminado, principalmente quando ele fica em cima do trem turco comemorando a vitória vestido com uma esvoaçante túnica branca. Não é o tipo do herói convencional que outros filmes espelham – o que levou alguns críticos a não acreditarem no trabalho de David Lean, diretor de outras películas memoráveis, dentre elas, A Ponte do Rio Kwai, de 1957. O tempo mostrou o erro de avaliação e o quão monumental é esta imperdível obra cinematográfica.
O rosto de O`Toole é sempre mostrado em um plano que nos agrada e parece estar em dois mundos, no imaginário da obra e na realidade do homem, que sugere ao espectador a ideia de que é vigiado e permanentemente observado em seus estereótipos, o que ele revela gostar.
O protagonista do filme é uma contraposição à arrogante aristocracia inglesa e, ao mesmo tempo, um rebelde na visão dos militares de seu país, pois se identifica mais com a selvageria dos povos denominados “bárbaros” do que com seus próprios colegas de corporação.
O diferencial do épico é retratado em sua filmografia, que não projetou cenas de violência banalizada, rios de sangue para impressionar e sim a resplandecência de um simples oficial desprovido do exagerado patriotismo, que foge da mesmice dos infalíveis militares retratados em tantas intragáveis fitas.
Lawrence da Arábia é uma ode ao cinema de qualidade, um clássico insuperável no gênero. Um filme que não se apaga de nossas memórias.