Se comparassem as qualidades dos alemães às de um animal, seriam a perspicácia e o instinto predador do falcão. Mas se comparassem as qualidades dos judeus às de um animal, seriam as mesmas do rato.
(Cel. Hans Landa)
Quentin Tarantino nos mostra os bastidores da II Guerra Mundial dentro de um plano imaginário. Fugindo das batalhas campais e bombardeios aéreos, permeia dentro da trama a ousadia de grupos e personagens, nos seus diálogos e tensões, fazendo a diferença dentro de um roteiro que mais parece feito para um livro – a história é contada em capítulos e surpreende pelo desfecho de cada etapa. O cineasta abusa de sua criatividade, vai além da imaginação e causa sobressalto no espectador com um final apoteótico que só poderia mesmo ter saído de sua cabeça, quando inverte fatos e muda a história.
O trajeto inusitado de seu trabalho foi solidificado com a escolha do excelente elenco. Traz, dentre outros destaques, o oscarizado Christoph Waltz, vivendo o astuto Cel. Hans Landa, uma das personagens mais marcantes da história recente do cinema. Ele é um caçador de judeus e, sem dúvida, brilha já nas cenas iniciais quando encurrala um fazendeiro francês e manda fuzilar impiedosamente judeus escondidos no porão – sentimos aí que estamos diante de um nazista perspicaz e não um mero matador. Uma garota consegue escapar do covarde ato.
Enquanto isso, também na Europa, conhecemos o tenente Aldo Raine (Brad Pitt) e seu grupo de soldados que se intitulam Os Bastardos, cujo objetivo é simplesmente aniquilar o maior número possível de nazistas, nem que seja a pauladas. O sangue é o combustível do destemido bando. Vejo a personagem de Brad como sendo uma forma de homenagear o sempre lembrado chefão Marlon Brando (o Don Corleone), e jamais uma imitação barata como destilaram alguns críticos e cinéfilos, mesmo porque, Brando é inimitável. Na cena de abertura, Tarantino relembra Ford, uma fez que faz uma filmagem usando o umbral da porta para mostrar os campos verdes da França. Da mesma forma, John Ford já havia feito isto no antológico Rastros de Ódio, de 1956, mostrando o homem solitário na vastidão da terra árida, no momento final de seu western.
Numa tentativa de derrubar importantes líderes do III Reich, dentre os quais os famigerados Adolfo Hitler e Joseph Goebbels, o esquadrão de Raine se encontra com a atriz alemã e agente infiltrada Bridget Von Hammersmark (Diane Kruger). Os destinos de todos convergem para o cinema onde Shosanna (Melánie Laurent) é a proprietária, e que também está planejando sua própria vingança contra os nazistas. Ela é a jovem que escapou do massacre na fazenda. O local foi escolhido para o lançamento do filme sobre o herói alemão Frederick. A parte em que Shosanna atira no jovem soldado Frederick Zoller (Daniel Brüh) transcende o simples apertar do gatilho – ódio e desejo se entrelaçam na crueza da guerra.
Quase no fim, o Führer é assassinado no cinema. Infelizmente, isto ficou na imaginação do diretor. A ficção é suave diante da realidade do horror que foi o nazismo. O rastro de sangue deixado pelo III Reich alemão é uma mancha que não se apaga.
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